Ex-presidiário quer mudar sistema carcerário nos EUA

22 de junho de 2016

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Na conferência anual de FORBES com os 400 maiores filantropos dos Estados Unidos, que aconteceu no último dia 10, em Manhattan, três grandes defensores dos direitos sociais debateram soluções para o sistema prisional norte-americano, que, atualmente, abriga 2,2 milhões de pessoas.

“O sistema judiciário criminal afeta a nossa economia, os nossos vizinhos, as nossas crianças e as nossas escolas”, disse Adam Foss, ex-promotor de justiça do país.

Foss se formou em Direito na Universidade de Suffolk, em 2005. Sem conseguir estágio durante a faculdade, ele resolveu fazer bicos em uma promotoria local de um bairro de Boston. Para ele, foi quando sua vida mudou completamente.

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“Quando entrei lá, vi grandes violações dos direitos humanos”. Ele contou que os funcionários conversavam e trocavam mensagens no celular enquanto os acusados recebiam sentenças que iriam mudar suas vidas, em atendimentos que duravam, no máximo, 20 minutos. “Os promotores, que tinham boa parte do poder daquelas pessoas nas mãos, eram totalmente irresponsáveis.”

Ele decidiu fazer alguma coisa para mudar essa situação. Tornou-se promotor e passou seis anos na periferia de Boston implementando projetos que evitavam a ida de crianças à cadeia.

No último ano, ele cofundou a organização não lucrativa Prosecutor Integrity, em parceria com o músico John Legend e com o empresário do cantor, Ty Stiklorius. A instituição pretende treinar promotores ao redor do país para mostrar como a cultura, a neurociência e a posição social podem influenciar nas decisões judiciais envolvendo crimes.

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Glenn E. Martin vivenciou o sistema criminal americano de outra maneira. Quando tinha 16 anos, ele foi preso por furtar uma loja e foi parar na penitenciária de Rikers Island, em Nova York. Na primeira semana, ele levou quatro facadas de um outro detento, enquanto os guardas assistiam e riam. A pena de seis anos passou para outra penitenciária do Estado, onde alguém perguntou se ele pretendia fazer faculdade.

“Foi a primeira vez que me perguntaram isso na minha vida inteira”, disse. Ele estudou Artes durante dois anos e conseguiu seu diploma graças a uma programa patrocinado pelo bilionário George Soros.

Em 2014, ele fundou a JustLeadershipUSA, uma organização que pretende diminuir o número de pessoas por cadeia. A intenção é fechar lugares como a Rikers, com uma grande quantidade de detentos, e espalhá-los por cadeias regionais, que ficariam sob a supervisão de programas de intervenção.

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“Quando eu estava preso, aprendi algo que a maioria dos americanos nunca irá saber: algumas das mentes mais brilhantes do país estão atrás das grades”, disse. “Eu fico me perguntando o que elas seriam se a cor da pele e a classe social não importassem tanto.”

Daniel Loeb é um dos filantropos que ajuda a investir em programas educacionais dentro das cadeias. Ele fundou a Third Point LLC, companhia de investimentos avaliada em US$ 2,6 bilhões e começou a cuidar da parte social de sua fortuna há 10 anos.

Isso aconteceu depois de o investidor ter descoberto números assustadores: nos Estados Unidos, 70% dos homens negros sem ensino médio irão passar pela cadeia até seus 30 anos, de acordo com a Instituição Brookings.

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Ele criou organizações como o Brennan Center na Universidade de Direito de Nova York, um instituto que promove ações contra o encarceramento em massa, e o Innocence Project, um grupo dedicado à estudar a origem racial e social das pessoas através do DNA.

“Penalidades duras, longas penas e sentenças mandatórias não estão funcionando e fazem o país ficar mais perigoso”, disse. “Queremos trazer equilíbrio para esse sistema, em que crianças pobres também tenham acesso à educação.”

Nos últimos 40 anos, o número de pessoas encarceradas cresceu 500%, de acordo com o projeto Sentencing, que se dedica a trazer dados para o debate sobre a reforma da justiça criminal. O governo norte-americano gasta US$ 80 milhões anualmente para sustentar o sistema, que é, de longe, o maior do mundo: são 700 pessoas detidas em cada 100 mil habitantes.

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“Não há um negócio no mundo que funcionaria desse jeito. Gastar esse dinheiro com pessoas que estão impedidas de trabalhar e de gerar impostos para pagar essa conta”, disse Foss.

Nos Estados Unidos, um em cada três homens negros e um em cada seis homens latinos têm chances de ir para cadeia, enquanto, para os brancos, a relação fica um a cada 17 homens.

A população negra, que representa 37% do país, é a maioria das cadeias: são 67% dos presos. “Da mesma maneira que olhamos para a escravidão com repulsa, espero que meus filhos e netos façam a mesma coisa com o sistema prisional”, disse Martin.