Em 2016, depois de 17 anos no JPMorgan, ela trocou seus terninhos executivos por jeans e se reinventou como empreendedora de fintech. Passou a oferecer a Kindur como uma consultoria financeira digital completa para pessoas aposentadas ou perto de se aposentar. A empresa iria administrar as carteiras de investimento dos clientes usando uma cesta de ETFs (exchange-traded funds) de baixo custo (da Vanguard, BlackRock e Schwab); dar-lhes conselhos sobre quando utilizar a previdência social; indicar de quais de suas contas de aposentadoria sacar primeiro; e, em muitos casos, vender-lhes uma renda vitalícia fixa – tudo com o objetivo de garantir que não ficassem sem dinheiro ou pagassem mais impostos do que o necessário durante a aposentadoria. Para simplificar, a Kindur até consolidaria as fontes de renda de um cliente em um “pagamento de aposentadoria” mensal.
LEIA MAIS: Carteira de investimentos: o que é e por quê você precisa de uma?
Horgan acredita que um fator adicional a seus problemas era sua própria identidade. “Eu não era vista como digna de investimento. Era velha para o setor, com quase 40 anos, não tinha um cofundador e havia trabalhado em banco.” Além disso, a ideia de vender renda vitalícia online sem vendedores comissionados que trabalham sob alta pressão foi recebida com amplo ceticismo – por parte dos capitalistas de risco e sobretudo dentro do próprio setor de seguros. Depois de meses infrutíferos batendo em portas nos EUA, encontrou um adepto em um refúgio de fintechs nos Alpes franceses. A Anthemis (empresa de capital de risco de Londres que, em 2010, participou da primeira rodada de financiamento da Betterment – a maior das consultorias automatizadas independentes) concordou em liderar um financiamento inicial de US$ 1,25 milhão em setembro de 2017, com participação da Point72 Ventures, do bilionário Steve Cohen. Por que mexer com os boomers? “É aí que está o dinheiro”, responde o cofundador da Anthemis, Sean Park, que é conselheiro da Kindur.
Horgan contratou um engenheiro, um designer, um assessor jurídico (do Citi) e alguns nerds da área financeira, como ela. Eles se instalaram em um escritório da WeWork. Do outro lado do recinto, uma mulher de 60 e poucos anos estava usando o serviço online Meetup da WeWork para organizar partidas de mahjong, o que dava um estímulo a eles sempre que os pessimistas insinuavam que os boomers não curtem tanto a internet.
Ainda assim, o desafio era intimidante: conceber um plano de “desacumulação” ou de gasto de patrimônio é mais complicado (e requer maior individualização e mais conjuntos de cálculos) do que determinar uma alocação adequada de ativos na fase de acumulação ou de poupança. No entanto, para manter uma atratividade ampla, o visual e o funcionamento do site não podiam ser muito complicados, acreditavam eles.
Os clientes em potencial podem alterar suas premissas (aposentar-se depois? gastar menos?) e fazer perguntas a coaches da Kindur por telefone ou bate-papo online. Acontece que os boomers adoram papear online, e metade deles usa o aplicativo da Kindur para smartphone em vez do site, relata Horgan.
VEJA TAMBÉM: Fundo de investimento em empresas sustentáveis capta R$ 1 mi em seis horas
Até agora, mais de mil clientes em potencial obtiveram planos gratuitos. É um processo de vendas lento, por isso não se sabe quantos deles contratarão os serviços da Kindur. Mas aqueles que o fizerem transferirão suas contas de previdência e investimentos para a plataforma da empresa (com custódia da Apex Clearing), e será cobrada uma taxa de administração anual de 0,5% sobre os ativos de investimento.
Não é de surpreender que os vendedores de renda vitalícia estejam buscando ambiciosamente negócios com os boomers. Aliás, o Alliance for Lifetime Income, um grupo do setor, é o único patrocinador da atual turnê dos Rolling Stones – aquela que atrasou devido à cirurgia cardíaca de Mick Jagger.
Contudo, o setor de seguros é resistente à venda de renda vitalícia online. Para complicar as coisas, Horgan queria um produto personalizado e que cumprisse sua visão do que é uma boa renda vitalícia. Entrevistou mais de 40 seguradoras para encontrar alguém disposto a trabalhar com ela e, finalmente, associou-se à American Equity, uma empresa de Iowa, com US$ 51 bilhões em ativos, fundada há 24 anos.
“Estamos trabalhando em parceria com a Kindur porque ela é um canal de distribuição do futuro”, afirma Ron Grensteiner, presidente da American Equity Investment Life Insurance Co. “Há um segmento da população agora, e haverá ainda mais no futuro, que quer fazer o planejamento da aposentadoria digitalmente – e de forma anônima, até certo ponto.”
E TAMBÉM: Os 25 melhores lugares para viver após a aposentadoria
Antes de colocar o site da Kindur no ar, ela arrecadou outros US$ 10 milhões, inclusive US$ 1 milhão do Inspired Capital, um novo fundo administrado pela bilionária Penny Pritzker e por Alexa von Tobel, que fundou o Learnvest, um site financeiro para mulheres da geração do milênio. (O fundo foi adquirido pela Northwestern Mutual e depois foi encerrado como marca.) “Ela está muitíssimo à frente da concorrência em termos de reconhecer que esta é uma grande oportunidade”, diz Von Tobel.
Bem, nem toda a concorrência. A United Income, um serviço online similar, abrangente e direcionado ao público de 50 a 70 anos que está se organizando para a aposentadoria, foi lançado em setembro de 2017 e já tem US$ 780 milhões em ativos sob gestão, com um valor médio de conta de US$ 833 mil. Diferentemente de Horgan, o fundador, Matt Fellowes, não teve de combater o viés antiboomer das firmas de capital de risco: ele usou seu próprio dinheiro e o de sua família, além de recursos da Morningstar, que financiou sua primeira startup de fintech, a Hello Wallet, uma ferramenta de orçamento automatizado e educação financeira destinada à geração do milênio.
A United Income é um pouco mais cara. A empresa cobra 0,5% ao ano sobre os ativos pela administração puramente automatizada e 0,8% por um “serviço de concierge” com acesso a um consultor financeiro pessoal. E não recomenda renda vitalícia. Por que não? Fellowes diz que menos de 10% de seus clientes enfrentam uma “lacuna de itens essenciais” – ou seja, suas despesas de vida básicas não são cobertas pela previdência social e por pensões –, e ele vê os bond ladders e outras estratégias de investimento de baixo risco como um método mais econômico do que a renda vitalícia para preencher essa lacuna.
Ainda não está claro o tamanho do papel que a renda vitalícia desempenhará na aposentadoria dos boomers. O que está claro, no entanto, é que a gestão digital do dinheiro deixou de ser uma exclusividade da geração do milênio.
Na verdade, o maior desafio para a Kindur, a United Income e as inevitáveis startups similares que surgirão talvez seja os boomers simplesmente optarem por obter sua assessoria automatizada junto às empresas financeiras consagradas que os ajudaram a fazer seu pé de meia desde o começo.
E MAIS: 3 dicas importantes sobre aposentadoria feminina
O serviço da Vanguard não apenas aloca os investimentos dos clientes, mas também oferece conselhos sobre como solicitar previdência social e quanto (e de quais contas) os clientes devem gastar na aposentadoria. Cerca de 85% dos usuários do Personal Advisor são maiores de 50 anos, e ele cresceu para US$ 130 bilhões em ativos sob gestão – muito mais do que todas as startups de assessoria automatizada somadas, independentemente da idade dos clientes que elas atendem.
O BOOM ORIGINAL
COMO JOGAR
Segundo Sam Zell
Uma forma pouco tecnológica de lucrar com o boom dos boomers é através de ações da Equity Lifestyle Properties de Chicago, uma das maiores operadoras de condomínios de casas pré-fabricadas, resorts para trailers e áreas de camping da América do Norte. O fundo de investimento imobiliário é presidido por Sam Zell, lendário bilionário do ramo de imóveis e ele próprio um membro da “geração silenciosa”. A ELP aluga residências simples e fáceis de administrar em comunidades semelhantes a resorts, em regiões como Florida Keys, na Flórida, e parques de trailers em regiões como Palm Springs, na Califórnia. Embora seus clientes possam estar se submetendo a uma redução de custos, as finanças da Equity Lifestyle estão ótimas. No ano passado, o faturamento subiu para quase US$ 1 bilhão, e os recursos provenientes das operações aumentaram 12%, chegando a US$ 372 milhões. Mesmo depois de o valor da ação ter sextuplicado desde junho de 2009, o dividendo da Equity ainda é de 2%. “A população de baby boomers continuará a ser geradora de demanda em nossas propriedades nos próximos 11 anos”, disse Zell em sua carta aos acionistas publicada em março.
Facebook
Twitter
Instagram
YouTube
LinkedIn
Baixe o app da Forbes Brasil na Play Store e na App Store.