“Nós somos capazes de trabalhar como qualquer outra pessoa”, afirma o jovem. Apesar de variações nas características de socialização, os autistas funcionais – ou seja, aqueles que não sofrem com déficit cognitivo -, estão aptos para exercer diversas funções e hoje representam um potencial não explorado pelas grandes empresas. “Esse número baixo de empregados traduz o preconceito e também a falta de informação da população”, acrescenta Rocha.
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As adaptações certamente serão necessárias, diz o especialista, mas isso não é suficiente para inviabilizar a contratação. Algumas mudanças simples, como um número maior de reuniões, planejamento mais detalhado ou até alguma mudança no espaço físico já são suficientes. “Se o autista for hipersensível à luz, por exemplo, talvez ele tenha que trabalhar o tempo todo de óculos. Se for hipersensível ao som, vai trabalhar de fone de ouvido. Ele pode ter uma característica de comunicação peculiar, mas é importante desmistificar isso e fazer com que se sinta acolhido.”
CONCENTRAÇÃO E RACIOCÍNIO LÓGICO
Com a ajuda de instituições de inclusão, o cenário começa, aos poucos, a sofrer mudanças, a partir do momento que algumas das características típicas do TEA passam a ser consideradas qualidades por empreendedores e companhias. A facilidade em reconhecer padrões, o perfeccionismo, o alto nível de concentração e raciocínio lógico fazem com que o colaborador autista se destaque, principalmente na área de tecnologia. “É comum que eles tenham uma excelente performance pelo comportamento. A gente até brinca com as empresas que, no mínimo, eles terão um rendimento de acordo com a média. Mas, claro, é importante não generalizar”, diz o psicólogo.
Assim também aconteceu no Shopping Iguatemi, onde dois portadores do espectro foram contratados para o setor de TI após um programa de inclusão da empresa. “Eles possuem uma característica forte no foco, na atenção aos detalhes, mas não podemos esquecer que são humanos, como qualquer outro”, ressalta Vivian Broge, diretora de RH da companhia. “Temos que buscar os talentos, não importa se existe alguma deficiência.”
Além da oportunidade, as empresas que já trafegam nessa direção chamam a atenção para o tratamento igualitário. Em ambas, os autistas, assim como qualquer outro funcionário, possuem plano de carreira e oportunidades para crescer. “É importante dar o contexto para eles se desenvolverem. Não é só contratá-los, mas assegurar que eles terão a mesma vivência dos demais”, explica Vivian.
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Para facilitar o processo de adaptação – dos dois lados -, as instituições especializadas em inclusão recomendam que tanto a equipe quanto o novo colaborador sejam preparados para uma nova dinâmica de trabalho. Enquanto o neurodiverso deve passar por um acompanhamento mental e prático nos primeiros meses de trabalho, com ajuda de psicólogos e centros especializados, os colegas devem receber informações da empresa sobre as características do novo profissional. “Quando essa pessoa for contratada, é hora de preparar a equipe para recebê-la”, explica Vitoriano.
Além disso, é possível que o autista demande algumas alterações no grupo, como uma frequência maior de encontros e uma equipe fixa. Segundo Vivian, no caso do Shopping Iguatemi foi preciso também dar uma atenção especial no processo de transição para o home office no início da pandemia. “Nos sensibilizamos com as dificuldades deles e passamos a fazer um encontro virtual diário com os líderes para diminuir a ansiedade dessas pessoas”, conta.
Mesmo assim, as empresas lembram que as adaptações são as mesmas feitas para outros funcionários com dificuldades – ou seja, não há regras na hora de incluir autistas no mercado de trabalho. “A convivência com pessoas com TEA depende de muitos fatores. Algumas têm traços mais fortes do que outras porque receberam mais estímulos ao longo da vida. A gente explica para os times quais podem ser as dificuldades que esses profissionais podem enfrentar, mas é uma possibilidade, não quer dizer que vai acontecer”, explica Tamara.
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DIVERSIDADE É LUCRO
Para além das cotas de inclusão previstas na Constituição Federal pela Lei 8213/91, que determina a contratação de deficientes em empresas com mais de 100 funcionários, a presença de colaboradores do espectro autista é uma ação humanitária, defendem os especialistas. “Quando você contrata um autista, aqueles funcionários que têm um irmão ou um filho na mesma condição passam a olhar de maneira diferente para o mercado. Elas passam a sonhar com um futuro melhor”, exemplifica a analista da CI&T.
Para as executivas, isso é notado na prática. Viviane conta que os dois colaboradores autistas foram capazes de reduzir pela metade o tempo que a empresa gastava com processamento de pagamentos. Enquanto isso, uma pesquisa com o público do shopping mostrou que o engajamento social da marca foi um dos atrativos para o consumo.
Não é só o autista que tem algo a ganhar com a inclusão no mercado: as grandes companhias podem – e devem – explorar a inovação que esse grupo de pessoas é capaz de proporcionar. “Você precisa ser uma empresa capaz de criar produtos para todas as pessoas. Diversidade, liderança e inovação são essenciais para gerar valor para o público”, afirma a diretora do RH do Iguatemi. “Quanto mais diversidade, mais lucro. Minha provocação é essa, de inovação, de agregar com algo novo. É também sobre humanidade, dar oportunidade para quem não teria organicamente”, completa Tamara, da CI&T.
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