Hoje, a lei brasileira permite que os pais tirem cinco dias de licença remunerada, e as mães, 120, depois de terem ou adotarem um filho.
Mas nos últimos anos, empresas têm aderido à licença parental estendida, impulsionada pelo programa Empresa Cidadã, que em 2016 possibilitou às companhias cadastradas estender o benefício para 20 dias para os pais e 180 dias para as mães em troca de incentivos fiscais. “Vínculo não se constrói em 5 nem em 20 dias”, afirma Camila Antunes, educadora parental e sócia-fundadora da Filhos no Currículo, consultoria empresarial voltada à parentalidade.
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Empresas como Grupo Boticário e Nubank igualaram as licenças remuneradas para homens e mulheres. Na primeira, o benefício é de 120 dias e obrigatório, e as mães ainda podem estender por mais 60 dias. Já o Nubank oferece um benefício global de 120 dias, ou quatro meses, para todos os funcionários. No Brasil, a empresa já garantia 180 dias de licença-maternidade, o que não mudou.
Especialistas afirmam que a igualdade das licenças fomenta a coparentalidade – a parceria entre os pais na criação do filho – e ajuda a eliminar vieses de gênero. “Se hoje as empresas não contratam mulheres por medo de uma gravidez, sem esse obstáculo, conseguem acelerar a representatividade feminina em todas as posições”, diz Michelle Terni, CEO e cofundadora da Filhos no Currículo.
O apoio das empresas à licença-paternidade é vantajoso para todos: melhora a vida dos funcionários em casa, a satisfação no trabalho e o bem-estar geral, mostra uma pesquisa da consultoria McKinsey.
Homens querem licença parental
Um estudo de julho deste ano feito pela Filhos no Currículo em parceria com a HR Tech Infojobs mostra que os pais buscam esse tipo de benefício. Segundo a pesquisa, as licenças estendidas aparecem entre as medidas mais desejadas pelos profissionais com filhos, depois de modelos de trabalho flexíveis, auxílio creche ou babá e programas de bem-estar. Sem o benefício, 4 em cada 10 homens já consideraram deixar o trabalho para cuidar dos seus filhos.
Mas ainda há um abismo entre pensar em deixar o trabalho e de fato fazer isso, já que o homem continua sendo definido pelo êxito profissional, enquanto das mulheres é cobrado principalmente o sucesso familiar. “Conciliar filhos e carreira ainda é um dilema feminino, mas essa cogitação dos pais aponta para uma tendência por uma paternidade protagonista”, diz a CEO da Filhos no Currículo.
Desde a implementação do benefício na empresa, em julho de 2021, até julho deste ano, 1.150 colaboradores usufruíram da licença parental, sendo quase 40% pais.
Na Cielo, há programa de apoio aos pais e mães durante o período de pré-natal e pós-parto, além da licença paternidade estendida e licença adotiva.
Praticamente 100% dos entrevistados na pesquisa da McKinsey consideraram a experiência de tirar a licença-paternidade positiva e fariam novamente. E 90% disseram que melhorou o relacionamento com sua parceira.
Veja depoimentos de pais que tiraram licença estendida:
Benefícios para as mães
A experiência com a licença-paternidade em outros países também revela benefícios para as mães. Quando a Espanha reservou apenas 13 dias de licença remunerada para os pais, as mulheres tiveram uma probabilidade significativamente maior de retornar ao trabalho depois do parto. Uma lei sueca que permite que os pais tirem até 30 dias de licença levou a uma redução de 26% nas prescrições contra a ansiedade para mães e uma redução de 14% nas hospitalizações ou visitas a um especialista. Hoje, os EUA são a única nação da OCDE que não oferece licença parental remunerada.
Mas os benefícios vão além da saúde física e mental. Estudos indicam que a licença-paternidade ajuda os casais a longo prazo, com o compartilhamento das responsabilidades domésticas e a redução do desgaste para as mães que trabalham. Com maior envolvimento paterno, elas podem retornar a suas funções mais cedo, compensando um pouco a chamada “penalidade da maternidade”. Um exemplo dessa situação é que, no Brasil, dois anos depois de tirar licença-maternidade, quase metade das mulheres está fora do mercado de trabalho, segundo um estudo da FGV.
Empresas também saem ganhando
- benefícios inclusivos, como a própria licença parental estendida, e auxílio creche, por exemplo;
- formação de lideranças em gestão de parentalidade;
- criação de uma cultura empresarial de acolhimento aos profissionais com filhos;
- criação de fóruns e espaços para discussão e trocas específicas sobre os desafios parentais;
- construção de uma rede com mentores dentro das próprias equipes para servir de referência e apoio aos profissionais que são pais.
Funcionários mais felizes são mais produtivos, mas a licença parental pode fazer parte de um movimento estratégico da empresa. “A mudança exige planejamento orquestrado por uma equipe multidisciplinar, engajamento da alta liderança e revisão de políticas acessórias que serão indiretamente impactadas pela mudança”, diz Vinicius Bretz, especialista em implementação de licenças parentais e consultor da Filhos no Currículo.
Bretz foi responsável por implementar essa mudança em uma das maiores multinacionais do setor de bebidas, com resultados diretos para o negócio, como a diminuição na taxa de turnover – a rotatividade dos funcionários –, aumento do engajamento interno, das promoções e da visibilidade da marca empregadora, melhorando os índices de atração de talentos. Segundo o especialista, barreiras financeiras e culturais são os principais entraves para as empresas enfrentarem o tema, que pode aumentar o valor de negócio para consumidores e acionistas e é um diferencial na batalha cada vez mais acirrada por talentos.
Licença parental na agenda da equidade de gênero
De acordo com o relatório mais recente da ONU Mulheres, no atual ritmo de progresso, levará 286 anos para alcançar a igualdade de gênero no mundo. E segundo o Fórum Econômico Mundial, levará mais 132 anos para fechar a lacuna global de gênero.
A licença-paternidade remunerada tem o potencial de contribuir significativamente para diminuir as disparidades salariais entre homens e mulheres. Grupo Boticário, Nubank e Volvo acabam de lançar um guia de boas práticas sobre licença parental, em parceria com as organizações 4Daddy, Filhos no Currículo, Instituto Promundo, Maternidade nas Empresas e Escola de Super Pais por Marcos Piangers. “O objetivo é inspirar outras empresas a incluírem a licença, o que contribui, inclusive, para o avanço da equidade de gênero no corporativo”, diz Fabiana de Freitas, vice-presidente de jurídico, compliance, ESG, assuntos institucionais e comunicação do Boticário.