Fazer parte ou liderar uma cozinha é uma operação das mais movimentadas. A roupa do chef traduz isso. Identifica profissionalismo, limpeza e principalmente respeito. Seu símbolo maior é a toque blanche, nome francês para a touca branca – o chapéu do chef. Em qualquer lugar do mundo, identifica-se o profissional por esse acessório. A cozinha também tem seu código de vestuário.
A história do uniforme gastronômico tem início na Idade Média. Nos monastérios, os reis franceses faziam visitas para degustar as caprichadas receitas dos religiosos. Os monges da cozinha usavam uma vestimenta diferenciada, feita para protegê-los de queimaduras e absorver o suor, além de redes para os cabelos, por uma questão de higiene. Os nobres acharam a proposta apropriada para seus cozinheiros. A roupa era igualmente sóbria, de cor cinza.
Na era pré-renascentista, o invejado e poderoso clã florentino dos Médici deu a primeira referência militar ao look, para que todos os seus empregados protegessem a casa de possíveis ataques. Na cozinha, surgia um jaleco que seria o precursor do dólmã (túnica, em turco) – a peça-piloto do futuro guarda-roupa gourmet.
Chegando a Paris pelas mãos da sofisticada rainha Catarina, o jaleco logo chamou atenção na corte. Quando Napoleão se tornou imperador, Marie Antoine Carême era o maior chef da França (seu trabalho é até hoje o mais marcante na história da gastronomia, tanto na criação como na importância que deu ao ritual à mesa). O monarca criou uma monumental sala de banquetes para as reuniões, e Carême foi convocado para regê-la. Carême foi o primeiro a usar uma dolma branca, para simbolizar limpeza, e vestiu assim toda a brigada, agora inspirada no exército de Napoleão. Só meio século depois, quando ir a restaurantes começou a virar moda, outro chef francês, Auguste Escoffier, redesenhou e formalizou o uniforme, privilegiando a hierarquia. Cada um da equipe tinha seu traje específico, de acordo com o posto que ocupava. Desde então, o chef executivo usa a touca de 12 polegadas de altura, para ser localizado em qualquer lugar e para agir e ser reconhecido como o general supremo da “batalha das panelas”. As dobraduras à mostra contabilizam as técnicas culinárias que o profissional domina. A dolma passou a ter corte duplo, para que manchas na frente mudassem rapidamente para um lado alternativo e limpo quando o profissional deparasse com clientes ou convidados.
Escoffier pensou também na praticidade, além da elegância. Saem os botões de grampos baratos e entram os de nó de pano ou perfurados em cascas de ostras. Ficou mais sofisticado e menos trabalhoso para desabotoar. As calças ficaram mais largas para facilitar o movimento e ganharam a estampa pied de poule (pé de galinha), ótima camuflagem para disfarçar manchas. Os sapatos passaram a ser antiderrapantes.
Outro chef francês, Alexis Soyer, apresentou uma proposta vanguardista, anos depois. Responsável pelo histórico Reform Club, em Londres, Soyer desfilava da cozinha ao salão com uma boina de veludo, laço e jaqueta de seda brilhante cortada na diagonal. Para ele, o profissional deveria ser apreciado, e não apenas ser visto como um servo qualquer, em uma era em que os homens da high society usavam preto, marrom e azul.
Se pensarmos nos nossos looks atuais, os chefs de hoje fazem o mesmo. A globalização trouxe também para os restaurantes a interação, a transparência e o estilo próprio. Com as cozinhas à vista dos clientes, é a vez de dolmas e uniformes pretos escondendo de vez as manchas dos preparos e parte das tatuagens dos novos – e celebrados – talentos. E nada mais fashion que a cor preta. Além das toucas, redes no cabelo estão em alta – ambas com materiais da melhor tecnologia. Chefs têm múltiplas escolhas, tanto na sua cozinha quanto na atitude: do tradicional ao moderno, passando pelo inovador. Afinal, moda é igual comida. Sempre novidadeira, sempre saborosa.
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