Lembro a primeira vez em que tive de colocar em prática publicamente as lições preciosas sobre como conduzir uma entrevista, que aprendi com jornalistas que vieram antes de mim e generosamente compartilharam seus segredos. Jornalistas, assim como empreendedores, podem ser muito solitários em suas decisões e processos criativos. Mas não precisa ser assim. Por isso, quando alguém senta ao seu lado e se dispõe a ensinar o que nenhum curso é capaz, é recomendável que você já comece a praticar a primeira lição das boas perguntas:
1. Escutar, atentamente e até o fim, o que lhe dizem.
Agora, ela se aproximava novamente, com aquele sorriso de quem está prestes a lhe entregar o maior desafio da sua carreira até então: “Preciso que você vá fazer uma entrevista com a Mara Gabrilli para as Páginas Vermelhas”. Mara é psicóloga, publicitária, fundadora da ONG Projeto Primeiro Passo e naquele ano, 2006, era secretária municipal da Pessoa com Deficiência e Mobilidade Reduzida de São Paulo (depois foi vereadora, deputada federal e atualmente é senadora pelo estado de São Paulo).
As Páginas Vermelhas eram o espaço nobre da revista em que eu trabalhava, trazendo sempre uma conversa longa e profunda – o que exigia que fosse bem conduzida. Eu tinha 23 anos de idade, quase dois de redação e uma hora para me preparar para aquele momento marcante.
Minha sorte, além de ter uma boa mentora, foi que o efeito de ter que improvisar, me virar naquela situação de pressão, se revelou com o tempo uma excelente técnica de trabalho.
Não há pesquisa, técnica nem perguntas inteligentes elaboradas previamente que superem o desejo espontâneo de saber mais sobre algo ou alguém. Uma pergunta motivada pela sincera vontade de conhecer é irresistível. Diante de Mara (e de centenas de entrevistados que encontraria ao longo da vida), eu realmente queria ir mais fundo. Era um ser humano interessado em outro ser humano.
Foi nesse tempo que aprendi que preparar uma pauta é tão importante quanto guardá-la na bolsa para me entregar desarmada à conversa. Até hoje, preparo pautas para grande parte dos meus diálogos profissionais, mas só as consulto depois de me deixar levar pelo momento e matar toda a curiosidade que não teria como ser programada.
3. Fazer perguntas simples
Por que você tomou essa decisão? Por que as coisas funcionam como funcionam? Por que desistiu? Ou por que seguiu em frente? Por que um caminho, e não outro? O mais relevante está contido nos porquês. Daí a importância da última dica que compartilho aqui para fazer boas perguntas.
4. Perguntar de outra maneira.
Quando o tema é delicado, dificilmente o que se procura virá logo na primeira resposta. Às vezes a pessoa não sabe dizer ao certo o que você busca, outras vezes é complicado falar por motivos alheios à conversa, não raro é mais fácil e quase automático desviar do assunto. Então, saber o que está buscando e encontrar outras palavras para tentar chegar ao mesmo lugar – claro, sem perder a empatia – pode fazer toda a diferença.
Ariane Abdallah é jornalista, autora do livro “De um gole só – a história da Ambev e a criação da maior cervejaria do mundo”, co-organizadora do “Fora da Curva 3 – unicórnios e start-ups de sucesso” e fundadora do Atelier de Conteúdo, empresa especializada na produção de livros, artigos e estudos de cultura organizacional. Praticante de ashtanga vinyasa yoga, considera o autoconhecimento a base do empreendedorismo.
Os artigos assinados são de responsabilidade exclusiva dos autores e não refletem, necessariamente, a opinião de Forbes Brasil e de seus editores.