No início da tarde da sexta-feira (31), o dólar era negociado a R$ 5,834, baixa preliminar de 0,7% em relação ao fechamento da véspera. Desde a segunda-feira (20), dia da posse de Donald Trump na presidência dos Estados Unidos, a moeda americana perdeu valor frente ao real em nove dos dez pregões realizados. A depreciação do dólar ante o real foi de 5,7%.
Há diversos fatores para isso, tanto internos quanto externos. Um dos mais recentes foi o segundo recorde registrado pelo Ibovespa neste ano. Na quinta-feira (30) o indicador subiu 2,82%, somando 126.912,78 pontos, quebrando o recorde registrado na segunda (27), quando a elevação foi de 1,97%.
Trump atenuou seu discurso de elevação de tarifas de importação de produtos chineses pelos Estados Unidos, contrariando suas promessas de campanha e o próprio discurso de posse. Quando perceberam essa mudança, os investidores voltaram a injetar dinheiro em países emergentes, como o Brasil.
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A atuação do Banco Central (BC), que seguiu realizando leilões para controlar a volatilidade do câmbio, também ajudou a conter o preço do dólar. Ainda em seu primeiro mês como presidente do BC, Gabriel Galípolo comandou a segunda intervenção da autarquia no câmbio na quarta-feira (29), prevendo estabilidade dos juros americanos e alta da Selic.
Receios e desvalorização
O comportamento do real em relação ao dólar em 2024 mostrou a forte aversão dos investidores internacionais aos ativos brasileiros. A moeda brasileira depreciou-se 27% frente ao dólar, sendo a moeda que mais perdeu valor entre a dois países emergentes. No entanto, esse fenômeno não se limitou ao Brasil.
As tensões geopolíticas, especialmente a guerra na Ucrânia e o ataque de Israel À Faixa de Gaza, elevaram o preço dos grãos e do petróleo no mercado internacional. A incertezas levou investidores a buscar ativos mais seguros, como os títulos públicos dos Estados Unidos.
Além disso, o Federal Reserve (FED), banco central americano, manteve uma política monetária apertada. Apesar de ter reduzido os juros americanos em um ponto percentual nas três últimas reuniões de 2024, ele manteve as taxas entre 4,25% e 4,50% ao ano, um percentual elevado e que drenou recursos globais para os Estados Unidos.
Já no cenário brasileiro, a maior preocupação dos investidores tem sido com o equilíbrio das contas públicas. O temor de um descontrole de gastos do governo amplia as possibilidades de inflação e leva os profissionais de mercado a assumir estratégias defensivas, comprando dólares.
Esse temor se agravou fim de novembro, quando foram anunciados o pacote de contenção de gastos e o projeto de reforma do Imposto de Renda pelo governo federal. A principal incógnita é quanto à real efetividade das mudanças anunciadas. Apesar da investida do BC para controlar a situação, subindo a Selic em 1 ponto percentual (p.p.) em dezembro, no último dia útil de 2024 o dólar foi cotado a R$ 6,18.
Opinião dos Especialistas
Luciano Telo, executivo-chefe de investimentos (CIO) para o Brasil no UBS Global Wealth Management, afirma que uma das causas principais da queda do dólar é a diminuição das tensões globais com relação a tarifas. “Isso fez com que moedas de países emergentes, como o Brasil, recuperassem valor frente ao dólar”, afirma o executivo.
Segundo ele, o real é uma moeda de que tende a amplificar os movimentos do mercado global. “Por isso, quando o cenário externo melhora e o dólar enfraquece, o real se valoriza de forma mais expressiva do que outras moedas”, diz Telo.
André Valério, economista do banco Inter, concorda que um dos principais motivos que contribuíram para a baixa da moeda americana foram as promessas não concretizadas por Trump. “A campanha sobre tarifas, que inicialmente impulsionou a valorização do dólar, teve um alívio”, diz. Além disso, o especialista reforça que o tom mais ameno com a China, utilizando as taxas mais como barganha do que para fins comerciais, fez com que o mercado reduzisse suas apostas na valorização do dólar.
Já no cenário doméstico, o período de calmaria na política brasileira no mês de janeiro contribuiu para a queda da moeda americana. “O recesso do Congresso e o Governo Federal sem grandes polêmicas também impulsionaram a apreciação do real”, explica Valério.
Projeções futuras
Apesar da queda recente, os especialistas destacam que o câmbio ainda é volátil e pode ser afetado por diversos fatores, como novas tarifas, eventos políticos internos e a política de juros do Fed.
Telo explica que a expectativa para o dólar é ligeiramente mais desvalorizada do que o valor atual, porque a incerteza fiscal persiste. “O real reage de forma sensível aos movimentos do cenário externo, amplificando tanto as perdas quanto os ganhos”, afirma. Para ele, a projeção é de R$ 6,40 para o final do ano.
Já para André Valério a projeção é um pouco menor. “Acredito que o dólar continue oscilando, com um valor justo entre R$ 5,70 e R$ 5,80, mas com uma expectativa de R$ 6 para o final do ano”, diz. O economista também destaca que o mercado permanece volátil a decisões de Trump e as políticas domésticas, que podem alterar essas projeções.
A movimentação do presidente dos Estados Unidos já teve novo desdobramento. Ainda na quinta-feira (30), Trump comunicou o aumento de 25% da taxa de importação para produtos vindos do Canada e do México. Além disso, ele reiterou sua ameaça de elevar os impostos em 100% para países membros do BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), caso desdolarizem suas negociações.