Na última sexta-feira (31), o Ibovespa finalizou o mês de janeiro em alta de 4,86%, algo que não acontecia desde agosto. O número foi um alento após o indicador registrar um recuo de 12.413 pontos ou 9,35% em 2024. Mais da metade (75%) desse decréscimo aconteceu ao longo do mês de dezembro.
A boa performance foi de se comemorar até o último fim de semana, quando os primeiros anúncios sobre taxas de importação saíram da Casa Branca, no sábado (1º).
No sábado, o presidente dos Estados Unidos determinou a imposição de tarifas de importação de 25% sobre produtos canadenses — exceto o petróleo, cuja taxa será de 10% — e mexicanos, além de aumentar em 10% o valor da importação chinesa. O anúncio sacramentou as suas promessas de campanha, o que pôs fim à expectativa do setor financeiro sobre se de fato haveria uma política tarifária mais rígida nos Estados Unidos. Ou seja, água no chopp do bom humor do Ibovespa.
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Apesar de a iniciativa por fim à uma espera, ela também gera temor quanto aos próximos passos de Trump. Ele ainda ameaça taxar a União Europeia e os países do BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), caso os últimos levem para frente a ideia de desdolarização de suas transações comerciais.
Para compreender o que está em jogo para o comércio internacional brasileiro, a Forbes conversou com especialistas.
Dois Lados de Uma Mesma Moeda
Segundo o Comex Stat, o Brasil exportou US$ 40,3 bilhões para os Estados Unidos em 2024, enquanto importou US$ 40,5 bilhões. O país de Trump é o segundo maior importador de produtos brasileiros, representando 12% do total, atrás somente da China, que registrou 28% das exportações no último ano.
Como a principal economia do mundo, qualquer iniciativa protecionista dos Estados Unidos afeta a dinâmica comercial global. Segundo Jonas Carvalho, CEO da Hike Capital, quando ações como essas ocorrem, os setores de commodities e siderurgia são os que mais sofrem. O Ibovespa, principal índice acionário da bolsa brasileria, deve repercutir essas ações, que que as principais produtoras de commodities importantes para a balança comercial estão listadas na B3.
Para o CEO, o setor energético e o agronegócio podem se beneficiar dessa nova dinâmica repleta de incertezas e dificuldades. Ele relembra que na primeira gestão Trump, com a guerra tarifária entre EUA e China, o Brasil ascendeu no mercado de soja e carne bovina no país asiático. “Caso novas tarifas sejam implementadas, o Brasil pode consolidar ainda mais a sua posição de liderança no fornecimento agrícola global”, afirma.
No entanto, ele adverte que há o risco dos Estados Unidos buscarem carne de outros países, como Austrália e Argentina. Inclusive, esse é um dos fatores motivacionais para Davi Lelis, especialista e sócio da Valor Investimentos, apontar que o setor de proteína animal pode ser o mais vulnerável às políticas tarifárias.
“A carne tem alta volatilidade nos preços, por conta da concorrência mundial e dos requisitos sanitários. Por serem itens altamente perecíveis, seria um desafio contra o relógio o Brasil achar outro comprador”, explica.
Lívio Ribeiro, pesquisador associado da FGV Ibre e sócio da BRCG Consultoria, destaca que o cenário afeta a todos e é difícil precisar o que pode ser bom ou ruim. “Todo mundo sofre com o aumento das incertezas. Em uma economia globalizada, se algo não vai bem no mercado externo, não tem como o bom desempenho do interno se sobrepor”, diz Ribeiro.
Enquanto Trump anuncia tarifas, países tarifados respondem na mesma medida. Foi o que aconteceu com Canadá, China e México, embora este último tenha conseguido suspender o imposto de importação por mais um mês nesta segunda-feira (3). “Essas decisões podem escalar, chegando a um ponto que não há como controlar, o que acho provável. Isso mudará as relações comerciais do mundo todo”, alerta o pesquisador da FGV.
Caso os produtos brasileiros sejam de fato tarifados, embora seja um problema significativo, não será o fim do mundo. Tudo isso dependerá não só das movimentações do próprio Brasil, mas do contexto mundial.
Carvalho considera que o país poderá buscar acordo bilaterais, diversificar mercados, além de investir em tecnologia e inovação. Em um cenário mais extremo, diante de práticas abusivas de comércio, ele ainda aponta que é possível recorrer à Organização Mundial do Comércio (OMC).
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