Quem Inova: Ann Williams, COO da Creditas, fala sobre gestão e diversidade no ecossistema

18 de março de 2021
Divulgação

A executiva norte-americana à frente da fintech de crédito consignado: parceria complementar com o fundador Sérgio Furio

Desde que pisou pela primeira vez em solo brasileiro no início dos anos 2000, Ann Williams não parou de fazer importantes movimentos no ecossistema de inovação brasileiro, até se tornar uma das protagonistas neste espaço. Uma das pessoas mais sêniores na Creditas, Ann é chief operating officer (COO) do unicórnio de crédito, e falou com Quem Inova sobre gestão, representatividade feminina entre fundadoras e executivas de startups, e sua visão de diversidade interseccional.

A norte-americana do estado do Arizona chegou no Brasil como uma das primeiras funcionárias da startup de mensageria Okto, até fazer um MBO (management buyout, em que a gestão compra a empresa) e se tornar CEO. Ann vendeu a Okto para a Spring Mobile Solutions em 2009 e, quatro anos depois, tornou-se sócia no fundo Redpoint eventures, um dos primeiros investidores da Creditas, onde conheceu Sergio Furio, fundador da fintech.

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Ann já tinha deixado a Redpoint e vinha atuando como consultora em startups quando procurou Furio para trocar ideias sobre um projeto. A esta altura, o fundo Kaszek Ventures, que havia entrado como investidor na Creditas, recomendou que o fundador buscasse ajuda para executar o plano de crescimento da empresa, que hoje vale US$ 1,75 bilhão. As conversas evoluíram, e os astros se alinharam.

“Quando entrei na Creditas, foi como se eu estivesse voltando para casa”, conta a executiva, que já conhecia boa parte do board da fintech, que incluía a Quona Capital, outro investidor de longa data na startup, além da Redpoint. Responsável por áreas como vendas e experiência do cliente, além de assuntos relacionados a pessoas, Ann é descrita por players do ecossistema, incluindo Furio, como a antítese do fundador, o que contribui para uma boa parceria entre os líderes.

“Temos habilidades muito complementares e, quando algo precisa ser feito, sabemos quem precisa executar: Sérgio é bem detalhista e analítico, ao passo que eu sou a pessoa que vê a situação de forma mais ampla. Sou muito comunicativa, uma boa ouvinte e gosto de pensar que sou uma líder muito humana. Isso também inclui conseguir ter conversas difíceis de uma forma que ajuda as pessoas a crescerem”, aponta a COO, acrescentando que também existem pontos de convergência entre os executivos.

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“Somos muito parecidos em nossa visão de cultura, acreditamos em dar oportunidades para que as pessoas aprendam e se desenvolvam, gostamos muito de trabalhar próximos das equipes, enfatizando o estilo de trabalho baseado em uma missão, que é ajudar o consumidor brasileiro que busca crédito para mudar sua vida”, ressalta a executiva. “Esse ethos já era parte da Creditas quando entrei, e o que eu faço é ajudar [Furio] a traduzir e implementar essa visão – é o que faz nossa parceria funcionar.”

LIDERANDO ATRAVÉS DO EXEMPLO

Com gêmeas de 11 anos em casa e fazendo home office durante a pandemia – assim como os mais de 2.000 funcionários da Creditas – a rotina de Ann é intensa. Apesar de trabalhar muito, a executiva diz que trabalha de forma flexível e integrada aos outros afazeres diários. “Eu não sinto que estou batendo ponto – eu frequentemente checo o Slack, respondo o e-mail de alguém, faço anotações sobre coisas que me ocorrem no final de semana ou à noite, mas não sinto que estou trabalhando”, aponta.

“Gosto muito de liderar pessoas, projetos e juntar os pontos no trabalho: esta é a grande função de um CEO ou COO de uma organização de alto crescimento – coordenar, conectar e levar as coisas adiante”, pontua a executiva, que apesar de sua dedicação pessoal ao trabalho, diz estabelecer limites quando o assunto é a expectativa em relação aos colegas.

“Quando começo a trabalhar com alguém, comunico quais são minhas expectativas, explico que tenho um estilo flexível [de trabalho] e que não existe uma expectativa de resposta num domingo pela manhã, a menos que seja uma urgência. Isso é uma via de mão dupla: se, por exemplo, tenho uma questão pessoal para resolver, bloqueio a agenda e digo que estou disponível para urgências, mas não é uma boa hora para falar”, aponta a COO da Creditas. “As pessoas respeitam minha agenda, e eu respeito a delas.”

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Ciente das pressões que colaboradoras – especialmente mães – podem enfrentar ao conciliar o trabalho e a casa, Ann sabe da importância de seu exemplo. “Tenho muito cuidado em dar até mais informações do que o necessário sobre a razão de não estar disponível. Pessoas podem me perguntar por que estou saindo mais cedo e eu digo que estou indo buscar minhas filhas na escola: sei que estou em uma posição em que posso dizer isso, mas quero que outras pessoas tenham a coragem [de se posicionar] também”, ressalta.

AVANÇANDO EM DIVERSIDADE

Quando o assunto é diversidade na Creditas, Ann diz que a empresa pensa no tema como consequência de inclusão. “Mulheres trazem mulheres, pessoas negras trazem pessoas negras, o mesmo acontece na comunidade LGBTQIA+. Mas elas irão embora se não se sentirem confortáveis para serem quem são, não receberem um salário justo e não tiverem as mesmas oportunidades do que pessoas de outros grupos”, aponta a executiva. Segundo Ann, a Creditas tem “vários sonhos” em relação à aquisição de talentos diversos, e a empresa tem iniciativas embrionárias em áreas como recrutamentos de pessoas com mais de 50 anos e refugiados.

Mulheres representam 51% do efetivo da Creditas e, no alto escalão, há seis mulheres em um time de 13 executivos. Segundo Ann, a empresa busca impedir discrepâncias de salário entre gêneros para as mesmas funções e gestores são questionados “mais de uma vez” quando um homem é promovido e uma mulher não é. “Somos muito intencionais em relação à equidade”, ressalta, acrescentando que a alta taxa de retenção na startup é um fator que contribui para o desenvolvimento profissional de mulheres na empresa.

No entanto, Ann admite que a empresa ainda precisa avançar na diversidade racial. “Temos bem menos negros e pardos em cargos sêniores de liderança do que em cargos de entrada”, aponta. Segundo ela, a empresa quer avançar tanto em termos de aquisição de talentos, contratando mais recrutadores negros, quanto na melhora de processos internos. “[Pessoas negras] precisam sentir que estão recebendo os mesmos salários e oportunidades de promoção do que seus pares brancos”.

Como parte das iniciativas para melhorar a representatividade racial na empresa, a Creditas fez seu primeiro censo no ano passado, e definiu uma conjunto de metas, que Ann diz ser “o mais realista possível”, com melhoras progressivas esperadas a cada semestre. “A cada review de performance, queremos que nossos números [em diversidade racial] melhorem – é um processo em andamento”.

REPRESENTATIVIDADE NO ECOSSISTEMA

Sobre desafios enfrentados por mulheres no ambiente de inovação brasileiro, Ann diz que o atual cenário em termos de diversidade de gênero em startups do país precisa ser endereçado. “[A falta de representatividade feminina entre fundadores] é um grande desperdício para o próprio ecossistema”, ressalta. Falando com a experiência de investidora, ela diz que a falta de mulheres em fundos contribui para piorar o cenário.

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“Mas vejo alguma mudança acontecendo, com fundos de venture capital sendo criados por mulheres, e mais mulheres se tornando investidoras anjo”, avalia Ann “Também vejo mulheres em cargos C-level em scale-ups como um importante passo anterior à fundação de uma empresa: uma vez que a startup faz um IPO, e [estas mulheres] têm alguma liquidez e começam a fazer outros planos, estão muito bem posicionadas com a linguagem e experiência para impressionar até mesmo fundos compostos somente por homens.”

Falando em IPO, Ann diz não ter certeza sobre o que deve fazer quando a Creditas decidir se tornar uma empresa de capital aberto. “Uma das razões pelas quais sou boa no que faço é não ficar olhando muito para o futuro, mantenho o foco no que está no meu prato e deixo as coisas fluírem”, ressalta a COO. “Temos pelo menos dois anos até o nosso IPO: até lá, tenho muito a processar, mas devo me envolver em startups via conselhos, investindo ou entrando em outro projeto. Sou definitivamente viciada nessa energia empreendedora de startups.”

Angelica Mari é jornalista especializada em inovação e comentarista com duas décadas de atuação em redações nacionais e internacionais. Colabora para publicações incluindo a FORBES (Estados Unidos e Brasil), BBC e outros. Escreve para a Forbes Tech às quintas-feiras

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