Dona das redes Casas Bahia, Ponto:> (ex-Ponto Frio) e da fabricante de móveis Bartira, a Via tirou o Varejo do nome em abril, enfatizando que o setor em que construiu a base de seu império não define mais a companhia. Para apoiar sua estratégia, acelerou a construção de um portfólio de empresas de tecnologia em 2020, com as aquisições da startup de entregas ASAPLog, a desenvolvedora de software i9XP e o banco digital BanQi, codesenvolvido com a fintech norte-americana Airfox, também absorvida no ano passado.
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“[Ao longo do próximo ano] estaremos com a nossa fintech totalmente implementada, que nasce com a maior experiência de crédito do Brasil e traz um diferencial gigante de mercado”, diz o executivo sobre a operação de serviços financeiros da companhia, que pretende causar uma “quebra de paradigma” no varejo e atuar como um importante mecanismo de bancarização. Cerca de 15 milhões de clientes já utilizam as soluções financeiras da Via, sendo 11 milhões no crediário, segundo a empresa.
“O brasileiro depende muito de crédito para comprar. Digitalizamos o crediário que nasceu na loja, e vamos acelerar bastante a penetração destes produtos financeiros digitais, de forma muito assertiva”, diz o CEO. Segundo Fulcherberguer, pesquisas feitas pela Via mostram que metade dos clientes das redes de varejo controladas pela Via só consegue comprar através de crediário. A companhia diz ter mais de 25 milhões de consumidores pré-aprovados para seu produto de crédito pessoal, e já começou a fazer empréstimos desatrelados das vendas de produtos.
No entanto, alavancar as vendas de produtos online também é uma prioridade para a empresa. No primeiro trimestre de 2021, a companhia registrou um volume bruto de mercadorias (GMV) de R$ 10,3 bilhões, com o canal digital sendo responsável por 56% deste valor. A Via quer representar 20% do mercado total de e-commerce nos próximos cinco anos, e o aumento da oferta de crédito tem um importante papel no cumprimento deste objetivo.
A rede física do grupo com mais de 1.000 lojas – que deve ganhar mais 120 até o final de 2021, em sua maioria no Norte e Nordeste do país – é outra peça instrumental no processo, pois oferece um custo de relacionamento com o consumidor significativamente mais baixo que no ambiente online. Além disso, a empresa conta com uma base de mais de 20 mil vendedores que se tornaram embaixadores do e-commerce com o advento da pandemia, diz Fulcherberguer:
“Antes [da Covid-19] talvez o maior desafio da companhia fosse mudar a cultura dos vendedores, que viam o online como um grande adversário, e que hoje veem este canal como core do trabalho deles. O vendedor se tornou uma ponte de acesso para consumidores fora dos grandes centros que têm relação conosco [e ainda não usa e-commerce] entrem no online.”
Ao olhar para o cenário que se desenha em serviços financeiros no contexto do open banking, sistema financeiro aberto atualmente em implementação pelo Banco Central, o CEO admite que a competição pelo consumidor será mais acirrada, mas ressalta que a Via tem vantagens nesse novo jogo.
O PAPEL DOS DADOS
A rede logística da companhia é outro ativo crucial para levar a visão da Via a cabo. A companhia transformou mais de 1,5 milhão de metros quadrados da rede de lojas em uma extensão de seus 26 centros de distribuição, e conta com os mais de 300 mil entregadores parceiros da ASAPLog, além de um foco em inovação aplicada nesta frente.
“Logística [para o e-commerce] é relativamente fácil nos grandes centros, mas [no Brasil profundo] isso é bem complexo: por isso, estamos investindo muito em tecnologia para ter uma capacidade preditiva de distribuição de mercadorias nas lojas,”, diz Fulcherberguer.
A Via também refez seus motores de decisão de crédito e cobrança, um processo que teve início em 2019. As atividades nessas frentes não têm intervenção humana, seja no ambiente digital ou offline. “Nosso modelo é totalmente automatizado e usa muita inteligência de dados e machine learning, e se retroalimenta a cada crédito concedido e a cada evento de cobrança”, explica o CEO.
Em um contexto em que a experiência do cliente se tornará cada vez mais automatizada e híbrida – um processo de compra pode, por exemplo, começar com o vendedor na loja e terminar online – a criação de uma cultura baseada em dados é crucial, ressalta Fulcherberguer.
“Não tem nada que façamos por aqui que não seja baseado em dados: antes, tínhamos várias [bases de dados] que não se falavam e hoje temos um data lake que é alimentado de diversas formas, seja pelo vendedor na loja, o que acontece no online, nas entregas, no crediário, no pós-venda”, diz o executivo. “Isso otimiza a nossa operação e nos torna cada vez mais preditivos.”
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Quando o assunto é a comparação entre outros marketplaces como Mercado Livre e Amazon, o CEO elenca as vantagens da Via em relação a empresas nativas digitais: “Estes players estão posicionados [para atender] 10% da população que compra online em grandes centros urbanos, mas há 90% da população que talvez sequer os conheça. Por outro lado, nossas marcas são reconhecidas por todos os brasileiros”, pontua.
“Até mesmo em localidades em que a logística é fácil de fazer, estamos crescendo de forma recorrente e com consistência. Quando tivermos maior penetração no mercado online nas regiões onde a logística é mais complexa e a necessidade de crédito é maior, teremos um ganho de market share ainda mais expressivo”, acrescenta o CEO.
Para avançar os aspectos tecnológicos de seu plano de negócios, a Via também aposta na inovação aberta e proximidade com startups. Evidência disso é a compra de uma participação minoritária do hub de inovação Distrito, com quem administra um fundo de venture capital de R$200 milhões. O acordo aconteceu sete meses depois da compra da ASAPLog, que se beneficiou do trabalho em infraestrutura que a Via já vinha fazendo para facilitar a integração tecnológica de startups adquiridas, e em cinco meses se tornou a maior transportadora da companhia.
“Em 2019, ressurgimos com uma cabeça de desenvolvimento aberto, e temos muitas possibilidades para agregar startups ao nosso ecossistema: podemos comprar essas empresas, elas podem prestar serviços para nós ou podemos também acelerar e investir nelas”, ressalta Fulcherberguer.
Para aumentar seu portfólio de startups – que também inclui a fintech Celer, comprada em abril deste ano – a Via está avaliando outras oportunidades de aquisição e investimento em empresas de tecnologia nos segmentos de serviços financeiros, varejo, marketing e logística.
Ao refletir sobre os aprendizados da digitalização dos últimos meses, Fulcherberguer nota que a aceleração do mundo online imposta pela pandemia é um desafio superado, e que a companhia conta com cada vez mais ferramentas e abordagens para aperfeiçoar sua relação com o consumidor.
“Nestes dois últimos anos, temos visto que tecnologia é cada vez mais acessível e pode ser implementada de forma muito rápida, especialmente para quem sabe desenvolvê-las de forma aberta”, avalia o executivo, acrescentando que as mudanças dos últimos meses também informam seu estilo de gestão.
“Minha transformação também tem sido diária: ser CEO de uma companhia hoje não tem muito vínculo com o que era há dois anos”, analisa Fulcherberguer. “O que não mudou é o foco em pessoas, seja as do nosso time ou os nossos consumidores. No final do dia, a gente está cuidando de gente o tempo inteiro.”
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