Quem Inova: Roberto Fulcherberguer, CEO da Via, fala sobre estratégia e digitalização do negócio

22 de julho de 2021
Divulgação

O líder da companhia: aposta na tradição do varejo físico para impulsionar adoção do e-commerce e serviços financeiros

Em meio às novas imperativas da economia digital, a Via aposta em inovação tecnológica e em sua presença física para fortalecer a atuação de sua plataforma de comércio eletrônico, logística e serviços financeiros, sobretudo entre a população desbancarizada.

Dona das redes Casas BahiaPonto:> (ex-Ponto Frio) e da fabricante de móveis Bartira, a Via tirou o Varejo do nome em abril, enfatizando que o setor em que construiu a base de seu império não define mais a companhia. Para apoiar sua estratégia, acelerou a construção de um portfólio de empresas de tecnologia em 2020, com as aquisições da startup de entregas ASAPLog, a desenvolvedora de software i9XP e o banco digital BanQi, codesenvolvido com a fintech norte-americana Airfox, também absorvida no ano passado.

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Em entrevista à Quem Inova, o CEO da companhia, Roberto Fulcherberguer, falou sobre as prioridades atuais da companhia, que atende 85 milhões de clientes em mais de 400 municípios brasileiros, por uma base de cerca de 41 mil colaboradores. Uma das principais áreas de foco da empresa é a expansão do braço de fintech: nesta segunda-feira (19), a companhia aprovou a destinação de R$ 300 milhões de capital próprio para crédito pessoal através do BanQi, que na semana passada recebeu o aval do Banco Central para funcionar como sociedade de crédito.

“[Ao longo do próximo ano] estaremos com a nossa fintech totalmente implementada, que nasce com a maior experiência de crédito do Brasil e traz um diferencial gigante de mercado”, diz o executivo sobre a operação de serviços financeiros da companhia, que pretende causar uma “quebra de paradigma” no varejo e atuar como um importante mecanismo de bancarização. Cerca de 15 milhões de clientes já utilizam as soluções financeiras da Via, sendo 11 milhões no crediário, segundo a empresa.

“O brasileiro depende muito de crédito para comprar. Digitalizamos o crediário que nasceu na loja, e vamos acelerar bastante a penetração destes produtos financeiros digitais, de forma muito assertiva”, diz o CEO. Segundo Fulcherberguer, pesquisas feitas pela Via mostram que metade dos clientes das redes de varejo controladas pela Via só consegue comprar através de crediário. A companhia diz ter mais de 25 milhões de consumidores pré-aprovados para seu produto de crédito pessoal, e já começou a fazer empréstimos desatrelados das vendas de produtos.

No entanto, alavancar as vendas de produtos online também é uma prioridade para a empresa. No primeiro trimestre de 2021, a companhia registrou um volume bruto de mercadorias (GMV) de R$ 10,3 bilhões, com o canal digital sendo responsável por 56% deste valor. A Via quer representar 20% do mercado total de e-commerce nos próximos cinco anos, e o aumento da oferta de crédito tem um importante papel no cumprimento deste objetivo.

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A rede física do grupo com mais de 1.000 lojas – que deve ganhar mais 120 até o final de 2021, em sua maioria no Norte e Nordeste do país – é outra peça instrumental no processo, pois oferece um custo de relacionamento com o consumidor significativamente mais baixo que no ambiente online. Além disso, a empresa conta com uma base de mais de 20 mil vendedores que se tornaram embaixadores do e-commerce com o advento da pandemia, diz Fulcherberguer:

“Antes [da Covid-19] talvez o maior desafio da companhia fosse mudar a cultura dos vendedores, que viam o online como um grande adversário, e que hoje veem este canal como core do trabalho deles. O vendedor se tornou uma ponte de acesso para consumidores fora dos grandes centros que têm relação conosco [e ainda não usa e-commerce] entrem no online.”

Ao olhar para o cenário que se desenha em serviços financeiros no contexto do open banking, sistema financeiro aberto atualmente em implementação pelo Banco Central, o CEO admite que a competição pelo consumidor será mais acirrada, mas ressalta que a Via tem vantagens nesse novo jogo.

“Temos ferramentas poderosíssimas para disputar esse share de mercado, seja em venda de produtos ou em serviços financeiros para o consumidor. Sabemos nos relacionar com os milhões de brasileiros que não tem conta bancária ou acesso a crédito, e essa é uma avenida importante de crescimento”, pontua.

O PAPEL DOS DADOS

A rede logística da companhia é outro ativo crucial para levar a visão da Via a cabo. A companhia transformou mais de 1,5 milhão de metros quadrados da rede de lojas em uma extensão de seus 26 centros de distribuição, e conta com os mais de 300 mil entregadores parceiros da ASAPLog, além de um foco em inovação aplicada nesta frente.

“Logística [para o e-commerce] é relativamente fácil nos grandes centros, mas [no Brasil profundo] isso é bem complexo: por isso, estamos investindo muito em tecnologia para ter uma capacidade preditiva de distribuição de mercadorias nas lojas,”, diz Fulcherberguer.

Este trabalho é feito com base na análise de comportamento do consumo dos milhões de clientes na base de dados da companhia, segundo o CEO: “Usamos todo o histórico de relacionamento que consumidores têm conosco, e o que eles estão pesquisando online. Esse cruzamento de informações me dá a chance de ser cada vez mais assertivo e vender algo que esteja mais próximo do cliente”, pontua o executivo.

A Via também refez seus motores de decisão de crédito e cobrança, um processo que teve início em 2019. As atividades nessas frentes não têm intervenção humana, seja no ambiente digital ou offline. “Nosso modelo é totalmente automatizado e usa muita inteligência de dados e machine learning, e se retroalimenta a cada crédito concedido e a cada evento de cobrança”, explica o CEO.

Em um contexto em que a experiência do cliente se tornará cada vez mais automatizada e híbrida – um processo de compra pode, por exemplo, começar com o vendedor na loja e terminar online – a criação de uma cultura baseada em dados é crucial, ressalta Fulcherberguer.

“Não tem nada que façamos por aqui que não seja baseado em dados: antes, tínhamos várias [bases de dados] que não se falavam e hoje temos um data lake que é alimentado de diversas formas, seja pelo vendedor na loja, o que acontece no online, nas entregas, no crediário, no pós-venda”, diz o executivo. “Isso otimiza a nossa operação e nos torna cada vez mais preditivos.”

A estratégia de Fulcherberguer também passa pela ampliação do marketplace da companhia, que atualmente conta com 55 mil lojistas, uma base que deve aumentar para até 90 mil até o final de 2021. Segundo o executivo, a ideia é trazer uma “prateleira infinita” para a plataforma, que até março tinha 24 milhões de itens, e usar a oferta de serviços financeiros para reter o cliente no ecossistema da Via. A empresa também deve colocar sua máquina logística à disposição destes vendedores entre o último trimestre deste ano e o começo de 2022.

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Quando o assunto é a comparação entre outros marketplaces como Mercado Livre e Amazon, o  CEO elenca as vantagens da Via em relação a empresas nativas digitais: “Estes players estão posicionados [para atender] 10% da população que compra online em grandes centros urbanos, mas há 90% da população que talvez sequer os conheça. Por outro lado, nossas marcas são reconhecidas por todos os brasileiros”, pontua.

“Até mesmo em localidades em que a logística é fácil de fazer, estamos crescendo de forma recorrente e com consistência. Quando tivermos maior penetração no mercado online nas regiões onde a logística é mais complexa e a necessidade de crédito é maior, teremos um ganho de market share ainda mais expressivo”, acrescenta o CEO.

INOVAÇÃO ABERTA

Para avançar os aspectos tecnológicos de seu plano de negócios, a Via também aposta na inovação aberta e proximidade com startups. Evidência disso é a compra de uma participação minoritária do hub de inovação Distrito, com quem administra um fundo de venture capital de R$200 milhões. O acordo aconteceu sete meses depois da compra da ASAPLog, que se beneficiou do trabalho em infraestrutura que a Via já vinha fazendo para facilitar a integração tecnológica de startups adquiridas, e em cinco meses se tornou a maior transportadora da companhia.

“Em 2019, ressurgimos com uma cabeça de desenvolvimento aberto, e temos muitas possibilidades para agregar startups ao nosso ecossistema: podemos comprar essas empresas, elas podem prestar serviços para nós ou podemos também acelerar e investir nelas”, ressalta Fulcherberguer.

Para aumentar seu portfólio de startups – que também inclui a fintech Celer, comprada em abril deste ano – a Via está avaliando outras oportunidades de aquisição e investimento em empresas de tecnologia nos segmentos de serviços financeiros, varejo, marketing e logística.

O sucesso da empresa em suas diversas frentes estratégicas está ligado ao avanço de uma nova cultura corporativa em que a centralidade do consumidor e inovação são palavras de ordem, segundo o CEO: “Muito do que fazemos na Via visa o fortalecimento de uma companhia que se molda junto com a evolução da sociedade: estamos correndo para antecipar mudanças e  estarmos prontos antes dessas grandes transformações”, pontua.

Ao refletir sobre os aprendizados da digitalização dos últimos meses, Fulcherberguer nota que a aceleração do mundo online imposta pela pandemia é um desafio superado, e que a companhia conta com cada vez mais ferramentas e abordagens para aperfeiçoar sua relação com o consumidor.

“Nestes dois últimos anos, temos visto que tecnologia é cada vez mais acessível e pode ser implementada de forma muito rápida, especialmente para quem sabe desenvolvê-las de forma aberta”, avalia o executivo, acrescentando que as mudanças dos últimos meses também informam seu estilo de gestão.

“Minha transformação também tem sido diária: ser CEO de uma companhia hoje não tem muito vínculo com o que era há dois anos”, analisa Fulcherberguer. “O que não mudou é o foco em pessoas, seja as do nosso time ou os nossos consumidores. No final do dia, a gente está cuidando de gente o tempo inteiro.”

Angelica Mari é jornalista especializada em inovação e comentarista com duas décadas de atuação em redações nacionais e internacionais. Colabora para publicações incluindo a FORBES (Estados Unidos e Brasil), BBC e outros. Escreve para a Forbes Tech às quintas-feiras.

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