Aurora boreal atrai turistas do mundo todo

24 de janeiro de 2015

O fotógrafo Francisco Mattos havia esperado por horas. Era noite em Longyearbyen, a cidade mais setentrional do mundo, e os 31 graus negativos tornavam difícil aguardar por aquela que prometia ser uma das melhores auroras boreais dos últimos tempos. Apesar dos gráficos de atividade solar da Nasa indicarem seu aparecimento para aquela noite, o céu escuro levou Mattos a uma cafeteria próxima. Uma bebida quente poderia reanimá-lo ou arrastá-lo definitivamente para a cama. Então ele recebeu a ligação de um amigo que acabara de ver o primeiro sinal verde surgir entre as estrelas. Mesmo desconfiado, com a expectativa de um alarme falso, guiou sua motoneve em direção a uma montanha de mais de mil metros de altura. Se a aurora boreal aparecesse, ele a veria em alto estilo: acima das nuvens.

Como as grandes estrelas da música, a aurora boreal costuma deixar seus fãs esperando por horas antes de iniciar um show. Ela também tem suas exigências: o céu precisa estar limpo, sem nuvens. Fugir para um lugar ermo, longe da interferência das luzes da cidade, também é essencial para vê-la em sua melhor forma. Naquela noite, a diva deu o ar da graça trajando verde, púrpura e amarelo e dançou no firmamento por uma hora. Do alto da montanha, Mattos tinha a sensação de poder tocá-la. “A aurora se mexia rapidamente e eu me sentia no topo do mundo”, relembra emocionado. O espetáculo – de grau 10 na escala da Nasa, ou seja, o nível máximo – aconteceu em janeiro de 2013 e foi um dos fenômenos mais impressionantes presenciados por Mattos, caçador de aurora boreal desde 2011.

O gaúcho de Passo Fundo percorreu o mundo – morou no Alasca, na Austrália e na Tailândia – antes de se estabelecer na ilha de Spitsbergen, pertencente ao arquipélago de Svalbard, região administrada pelo governo da Noruega, atraído por sua exuberante paisagem polar (60% da região é coberta por geleiras). Estava a caminho do supermercado quando trombou com uma aurora boreal pela primeira vez. “Eu não costumava olhar muito para o céu, mas de repente vi aquela luz verde e fiquei hipnotizado”, afirma. Viciou. Agora, de novembro a fevereiro, meses de escuridão total no arquipélago, o fotógrafo dedica-se à caça de aurora boreal. No período de sol ininterrupto, ou seja, de abril à metade de setembro, ele ajusta o foco em direção à vida selvagem ártica. Nessa época do ano, ursos e morsas são os protagonistas de suas lentes.

A aurora boreal tem origem a partir das explosões que acontecem na superfície do sol. Essas partículas (elétrons) viajam pelo espaço e recebem o nome de ventos solares. Ao se aproximarem da Terra, esses ventos são atraí­dos para os campos magnéticos (polos Norte e Sul). Quando entram em contato com a atmosfera formam as cores avistadas no céu. O verde, mais comum, resulta do contato com o oxigênio; os tons de violeta e vermelho, com o nitrogênio. No Polo Norte, a aurora é chamada de boreal; e no Sul, austral. Mas quase não se ouve falar de aurora austral, devido à dificuldade de fazer turismo durante o inverno antártico.

“O melhor período para ver aurora boreal é de setembro a março”, afirma o advogado Daniel Japor, outro brasileiro capturado pelos feitiços dessa dama temperamental. Viu sua primeira aurora há nove anos na cidade de Tromso, Noruega. Apaixonado, decidiu voltar para visitá-la nos anos seguintes. Em 2010, abandonou a carreira no direito para inaugurar a agência Geo­trip, especializada na caçada de aurora boreal. Atualmente, acompanha cerca de 150 brasileiros por ano, distribuídos em oito viagens, no roteiro formado por Tromso, Longyearbyen e Kilpisjärvi, na Finlândia.

Em outubro de 2014, presenciou um dos mais imponentes espetáculos de sua carreira de caçador. E olha que são mais de 100 auroras no currículo. “Parecia uma trança de cabelo. Mechas nas cores púrpura, verde e amarela giravam no horizonte. O espetáculo durou 15 minutos”, relembra.

Japor escolheu Tromso como destino principal de seu roteiro turístico devido às suas temperaturas amenas quando a comparamos com outras regiões localizadas no cinturão de aurora boreal. A cidade litorânea de 70 mil habitantes recebe a corrente marítima do Golfo e dificilmente vai abaixo dos 10 graus negativos. Muito frio? Fairbanks, no Alasca, outro famoso point de caçadores de aurora, chega facilmente aos 30 graus negativos. Islândia; Murmansk, na Rússia; Kiruna, na Suécia; e partes do Canadá são outros lugares de onde é possível avistar a aurora boreal.

Tromso apresenta mais uma vantagem: “negociar” com as nuvens. “A região no entorno da cidade possui diversas estradas através das quais fugimos das nuvens e da iluminação das ruas”, afirma. O advogado chega a dirigir 250 quilômetros a partir do centro de Tromso em busca de sua presa. Para saber em qual direção seguir, ele consulta aplicativos que fornecem o mapa de nuvens da região, além de sites como o da Nasa para verificar a atividade solar. “Quando a explosão solar acontece, as partículas viajam entre 24 e 72 horas até se aproximarem do nosso planeta. Analisamos o sol hoje para sabermos como será a aurora boreal daqui a dois ou três dias”, afirma Japor.