O remédio, que recebeu o nome de Myrkl e deve chegar em breve ao Brasil, garante quebrar o álcool no intestino antes que ele chegue ao fígado. É justamente no fígado que a molécula de álcool é quebrada em algumas substâncias que seguem pelo sangue até o cérebro para causar uma sensação agradável, mas também em outras substâncias que causam o mal-estar da ressaca.
Eu sou especialista no uso de álcool e drogas. Tenho de confessar: há 40 anos, desde que me formei, venho escutando duas promessas na área médica: uma vacina que impeça alguém que faz uso de drogas de sentir os efeitos dela e, portanto, de tornar-se dependente, e algum remédio que não cause embriaguez. Essas alternativas até agora não tinham saído do papel. E não era por falta de vontade de estudar isso, porque muita, muita pesquisa foi e é feita nesse sentido. Nada parecia conseguir cumprir essas promessas.
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Sejamos claros. Não dá para impedir os efeitos colaterais sem tirar também esse efeito, digamos assim, gostoso do álcool, motivo pelo qual as pessoas bebem. A imensa maioria das pessoas bebe de forma moderada justamente em busca disso.
A questão que me deixa curioso é: se o comprimido evita a ressaca, mas também reduz os efeitos da bebida no cérebro, por que então as pessoas que querem continuar bebendo fariam uso dessa pílula? Não seria melhor trocar uma bebida por uma similar sem álcool, se, em tese, o efeito seria mais ou menos o mesmo?
Evidentemente, a ciência avança e, se de fato o Myrkl funcionar e trouxer benefícios, só temos que comemorar. Até lá, eu penso que a melhor postura é de prudência, até que saiam mais pesquisas a respeito dessa novidade.
Dr. Arthur Guerra é professor da Faculdade de Medicina da USP, da Faculdade de Medicina do ABC e cofundador da Caliandra Saúde Mental.