Embora ainda esteja aprendendo – e considere o português tão difícil quanto o coreano – a executiva percebeu que se comunicar, mesmo sem saber o idioma oficial, não seria um problema no Brasil. “Eu sou nova aqui e, mesmo em um período de home office por conta da pandemia, já percebi uma abertura maior do brasileiro para a comunicação, o que facilita a minha interação com a nova equipe”, revela em entrevista – em inglês – para a Forbes. Por sorte, o idioma realmente não foi o bicho de sete cabeças que ela imaginou durante a mudança. No entanto, outro incômodo surgiu: “Não esperava congelar nesse país”, brinca a alemã sobre o clima de São Paulo nas primeiras semanas de agosto.
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Após estudar economia e começar sua carreira no banco de investimentos Bank of America-Merrill Lynch, em 1997, Hilke adquiriu prática e conhecimento no setor de investimentos e private equity. Em 2003, fez sua primeira mudança de emprego e cidade: de Frankfurt para Berlim e do banco para o Daimler Financial Services, onde ficou por quase dez anos e teve a sua primeira grande mudança de ares. “Em 2010, a empresa queria se estabelecer na Índia e precisava de representantes. Então eu fui. Era louca o bastante para fazer essa grande mudança.”
Uma loucura completamente consciente e estratégica, que fez com que a alemã aprendesse muito sobre como tocar uma empresa. Embora não fosse diretora ou presidente, assistiu de camarote todos os processos e regulações necessários para estabelecer uma companhia em um novo país. Apenas um ano após essa experiência, foi chamada pelo Banco Mercedes-Benz para fazer o mesmo trabalho na Malásia, mas como diretora. “Nunca tinha visitado o país, mas aceitei o trabalho. Fiquei cerca de cinco anos na Malásia, muito mais tempo do que na Índia”, recorda.
Em outubro de 2016, foi chamada para fazer a mesma coisa na Coreia do Sul, ainda como diretora. Ao todo, sua jornada corporativa pela Ásia durou 10 anos. Culturas e costumes diferentes, mas no mesmo continente. Até surgir uma proposta no Brasil. “É um lado completamente oposto do mundo. Eu não esperava uma mudança tão grande”, revela. Mas, como boa curiosa, Hilke aceitou o cargo de presidente e CEO do Banco Mercedes-Benz em território brasileiro.
POR TRÁS DE UM TÍTULO
O Banco Mercedes-Benz, com 25 anos de história, chegou ao Brasil em 1996 para atuar no segmento de veículos comerciais e de automóveis de passeio da marca. De certo modo, finanças e carros nunca foram assuntos vinculados ao universo feminino. E foi exatamente nesse contexto que Hilke ganhou representatividade. “Eu fui uma das únicas mulheres na Índia. A primeira diretora na Malásia e na Coreia e, agora, a primeira CEO no Brasil. Eu não tenho noção disso todos os dias, mas acho que eu virei sim uma fonte de inspiração”, assume.
“Eu mesma sou diversa”, destaca. “Sei o quanto somos importantes para uma tomada de decisão mais eficiente em uma companhia.” Tudo isso a executiva aprendeu na prática – não apenas na carreira. “Na minha infância, aprendi que, para cuidar da nossa fazenda, era preciso um trabalho em equipe. Eu e meu irmão fazíamos as mesmas tarefas, sem distinção de idade ou gênero. Você não consegue sobreviver a um frio pesado no interior da Alemanha agindo sozinho. Eu consegui transferir esses ensinamentos da vida na fazenda para o meu momento atual.”
Mais do que trabalhar em equipe, Hilke acredita que a infância foi uma fase determinante para a construção de sua personalidade forte. “Meus pais sempre nos deram a impressão de que poderíamos fazer qualquer coisa.” Com um oceano de opções à sua frente, a pequena alemã sonhava em pilotar um avião. Observando o centro de treinamento para pilotos perto de onde morava, sabia que aquela era a profissão certa para ela. Na escola, contrariando todos os estereótipos e pré-julgamentos sobre aptidões femininas, era ótima em matemática e física.
Foi então que, aos 17 anos, a executiva sofreu um acidente de moto e mudou os rumos de sua vida. “Eu precisava passar em alguns testes físicos para me tornar pilota, o que se tornou inviável após o ocorrido.” Mesmo sem guardar grandes traumas e mágoas dessa época, ela lembra que não foi uma decisão fácil desistir da aviação. “Não tenho mais sentimentos negativos sobre esse acidente, mas ele mudou a minha vida e fez com que eu crescesse mais rápido. Um acontecimento assim faz com que a gente amadureça e aprenda a superar desafios”, ressalta. Quando abriu seus olhos novamente para as oportunidades do mundo, avistou a matemática como uma grande parceira. Foi assim que seguiu para a carreira financeira.
“Se alguém disser que você não pode fazer algo por ser mulher, jamais acredite. Quando colocam isso na cabeça de meninas, ainda pequenas, acabam com paixões que podiam fazer parte de suas vidas.” De certa forma, com sua imagem e suas palavras, Hilke quer alcançar mulheres que já tiveram sonhos ceifados em algum momento. “Acreditem em vocês”, reforça.
Ao carregar na bagagem aprendizados adquiridos em cada país por onde passou, a alemã tem boas expectativas para a sua fase no Brasil. Os planos para o fim do inverno são maiores do que uma simples visita à praia no final de semana – embora ela também esteja esperando por isso ansiosamente. “Minha jornada ainda não está completa, mas aqui estou eu.”
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