Essa manifestação artística, política e cultural atraiu, nos dias 13, 15 e 17 de fevereiro de 1922, no Theatro Municipal de São Paulo, jovens contestadores que deram um novo rumo ao próprio Brasil. Mas o que a Semana de Arte Moderna tem a ver com a gastronomia? A culinária reflete – e sempre refletiu – a identidade
brasileira. E os principais protagonistas do modernismo têm histórias interessantes sobre a arte de comer e de cozinhar.
Leia mais: Nosso brinde às poderosas mulheres do champanhe
Mário e seus cardápios
Os cardápios são reflexo da paixão de Mário pelo estudo da cultura popular e se transformaram em testemunhas de sua vida pessoal e profissional, pois, quando decodificamos seu conteúdo, entendemos a origem, normas e gostos alimentares da elite da época.
Esse lado gourmet e a atração pela culinária brasileira ultrapassavam os cinco sentidos, transformando-se em objeto de estudo do escritor, que queria conhecer e “mastigar” o Brasil, com suas tradições e as infl uências estrangeiras formando a mistura essencial brasileira. Duas das obras mais conhecidas em que o escritor fez uso de pratos brasileiros são o clássico “Macunaíma” e o inacabado “O Banquete”, publicado postumamente.
Tarsila, rãs e Abaporu
Uma das correntes mais marcantes da geração modernista é o Movimento Antropofágico, que nasceu durante um jantar. A principal iguaria servida foi uma porção de rãs. A pintora Tarsila do Amaral, que acompanhava o então marido, Oswald de Andrade, ao vê-las, fez uma associação com pequenos corpos humanos e levantou uma indagação se, naquele momento, eles estariam sendo quase antropófagos.
Dizem que, depois do jantar com rãs e inspirada por esse ideal antropofágico, Tarsila do Amaral pintou a obra-prima considerada o maior símbolo do movimento:
“Abaporu”, que signifi ca “o homem que come”.
E se Mário de Andrade guardava cardápios, Oswald de Andrade era conhecido por promover aventuras gastronômicas e banquetes emblemáticos. Ele possuía um caderno de receitas em que registrou suas comidas preferidas: vatapá, feijoada e quindim. O interesse destes e de outros artistas, que foram a vanguarda no início do século passado e cujas obras continuam sendo cultuadas até hoje, mostra quanto a culinária é um aspecto importante da cultura brasileira.
Carla Bolla é restauratrice do La Tambouille, em São Paulo.
Artigo publicado na edição 95 da revista Forbes, em março de 2022.