O capitalismo é um sistema deflacionário. A competição pressiona os agentes de mercado a usarem inovações e tecnologias para reduzir custos de produção. Com o avanço da tecnologia, as empresas produzem mais com menos recursos. Por exemplo, uma fábrica com novas máquinas pode dobrar sua produção, reduzindo o custo por unidade. Entretanto, no Brasil, mesmo com a diminuição dos custos de produção, os preços continuam subindo. Isso acontece por causa da expansão da base monetária, que leva a aumentos no nível geral de preços, o que comumente se chama inflação.
A inflação ocorre quando há mais dinheiro em circulação do que bens e serviços disponíveis. Isso resulta na perda do poder de compra da moeda. Por exemplo, desde 1994, o real perdeu mais de 87% do seu valor. Isso significa que, para igualar o poder de compra de R$ 100 de 1994, seriam necessários cerca de R$ 807,90 hoje.
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Para preservar o valor da moeda, décadas atrás, existia lastro no ouro. Diferentemente das moedas fiduciárias, o ouro tende a manter ou aumentar seu poder de compra no longo prazo. Isso ocorre porque ele não pode ser criado do nada ou impresso. Mas o ouro é difícil de ser transportado e, por esse motivo, entre outros, criou-se o papel-moeda. As moedas podem perder valor devido à inflação.
Para entender melhor, é crucial diferenciar expansão monetária, inflação, preço e índice de preços. A expansão monetária é o aumento da quantidade de dinheiro em circulação. Quando a base monetária se expande sem um aumento na oferta de bens e serviços, a moeda perde valor. Isso é a inflação. Os preços sobem porque agora você precisa de mais unidades monetárias para adquirir os mesmos produtos ou serviços. Um índice de preços, como o IPCA, o principal no Brasil, reflete essa alta. Portanto, a expansão monetária não é sinônimo de inflação, porém é a principal causa que pode desencadeá-la.
É nesse ponto que a inteligência artificial (IA) se torna uma ferramenta transformadora. Durante a Revolução Industrial, a mecanização e a padronização permitiram a produção em massa. Isso, por sua vez, baixou custos. A IA escala serviços de maneira similar. Ela distribui custos de desenvolvimento e manutenção de sistemas entre mais usuários. Isso elimina a necessidade de aumentar proporcionalmente os recursos humanos.
A telemedicina e os diagnósticos com IA ajudam médicos a atender mais pacientes. Algoritmos de IA analisam dados médicos, como exames e históricos, diminuindo a necessidade de intervenção humana. Isso reduz custos para os pacientes e leva serviços de saúde a áreas remotas ou com poucos recursos.
Outra aplicação da IA é na análise de risco, detecção de fraudes e gestão de investimentos. Antes, essas tarefas precisavam de muitas equipes de analistas. Agora um único algoritmo pode processar milhares de transações por minuto.
Empresas de educação usam IA para personalizar o aprendizado. A IA avalia o desempenho, identifica dificuldades e adapta o conteúdo para cada caso. Assim, milhões têm acesso a educação de qualidade por baixo custo, sem precisar aumentar o número de professores ou recursos.
Plataformas jurídicas usam IA para ajudar com disputas legais menores, como multas de trânsito e cancelamento de assinaturas. Esses serviços custam bem menos que contratar um advogado, tornando a Justiça mais acessível.
Chatbots de IA para suporte ao consumidor resolvem problemas comuns. Eles permitem pedidos e a resolução de problemas simples sem interação humana. Essa capacidade aumenta a eficiência e reduz custos.
Portanto, a IA tem o potencial de trazer para os serviços ganhos de produtividade semelhantes aos da Revolução Industrial, impactando diretamente os preços relativos e o nível geral de preços na economia. Principalmente porque o PIB do Brasil é, há décadas, majoritariamente composto por serviços, que representam mais de dois terços da produção.
Por isso, a IA pode influenciar a política monetária e reduzir as taxas de juros. Com ganhos de produtividade gerando maior produção, o imposto inflacionário é menos percebido, resultando em uma estabilidade de preços em vez de deflação. Assim, o Banco Central pode então reduzir a Selic, a taxa de juros básica. Juros mais baixos tornam empréstimos mais fáceis, o que estimula o crescimento econômico. Famílias podem comprar casas, carros ou investir em negócios com juros menores, melhorando a qualidade de vida e a segurança financeira.
Mas, mesmo que a IA contribua para uma economia mais eficiente e você viva nesse sistema deflacionário, provavelmente continuará a ver seu poder de compra se deteriorar e os preços aumentarem. Por quê?
Porque o governo, que tem o monopólio da criação de moeda, sabe que pode se apropriar de bens e serviços na economia real criando mais moeda e usando-a para pagar seus gastos. E assim acontece a expansão monetária, controlada por decisões que você não pode influenciar, corroendo ano após ano o valor do seu dinheiro.
Como Ludwig von Mises afirmou em “As Seis Lições”: “O governo pode considerar que, como método de arrecadar fundos, a inflação é melhor que a tributação: esta é sempre impopular e de difícil execução”.
Essa sutileza foi observada por Milton Friedman, que disse: “A inflação é a única forma de tributação que pode ser imposta sem legislação”. Já o impacto inflacionário foi ressaltado por Ronald Reagan: “A inflação é tão violenta quanto um assaltante, tão assustadora como um ladrão armado e mortal como um assassino”.
Será que se pode considerar a inflação como delito? O que você pensaria de alguém que, nos últimos dez anos, deteriorou 47% do poder de compra da sua moeda? O Estado fez isso no Brasil.
Certamente, a inflação é um imposto não previsto na Constituição. Mas como você pode parar essa infração dos seus direitos se os instrumentos de representação política e de limites aos abusos do governo se mostram impotentes? Nesse caso, nem a IA pode salvar seu poder de compra, apesar de revolucionária.
Então, use os ganhos e a economia que a IA trará nessa pequena janela de oportunidade para aumentar seu patrimônio, mas proteja-o. Talvez, então, seja hora de considerar uma moeda que não inflacione e seja fácil de armazenar… Quem sabe, uma espécie de ouro digital?
*Por Henrique Roman, empresário e associado do Instituto de Estudos Empresariais (IEE)
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